25 de outubro de 2020

os meus cinco minutos # 48

Segundo Fernando Pessoa, os efeitos da “dor de pensar” encontram-se resumidos em dois versos de uma das suas quadras populares: “Porque é que p’ra ser feliz/ É preciso não sabê-lo?”. Já Manuel António Pina discute de uma forma mais pragmática a essência da felicidade, chegando à conclusão de que o PIB não é, de todo, um índice fiável de felicidade. Nisso estamos de acordo.

De facto, Pessoa não consegue ser feliz devido à sôfrega intelectualização do real, não conciliando aquilo que deseja com aquilo que realiza, gerando, pois, uma frustração e um consequente drama de personalidade. É, então, impedido de ser feliz devido à lucidez, procurando a realização do paradoxo de ter uma consciência inconsciente. Todavia, ao pensar sobre o pensamento, percebe o vazio que não lhe permite conciliar a consciência e a inconsciência. Gostava, muitas vezes, de ter a inconsciência das coisas ou de seres comuns que agem como a “pobre ceifeira” ou que cumprem apenas com as leis do instinto, como o “Gato que brinca na rua”. Logo, o ortónimo não consegue fruir instintivamente a vida por ser consciente, mas também pela própria efemeridade da mesma. Assim, a efemeridade do tempo, enquanto fator de desagregação desperta-lhe o desejo vívido de ser novamente criança, sentindo a nostalgia da infância como um bem perdido, “Criança contente de nada”. Tal leva-o à desilusão perante a realidade da vida e do próprio sonho. Neste sentido, “para se ser feliz é preciso saber-se que se é feliz”, pois “Não há felicidade em dormir sem sonhos.” Para Pessoa, não há dúvida de que “Saber é matar, na felicidade como em tudo. Não saber, porém, é não existir.”

No meu parecer, a felicidade – aquela que se afasta da ingenuidade pueril e inviolável da infância estéril - pode ser algo consciente, matéria palpável e altamente transmissível. Ela surge nos pequenos momentos do dia a dia. Surge da partilha. Surge nos sorrisos trocados com os outros, ou quando nos reunimos com a família.  Não será a felicidade uma evolução do pensamento eunuco dos petizes, a materialização dos sonhos e das conquistas e a consciencialização de alguma volatilidade? O que é, aliás, a felicidade, senão a subjetividade dos olhares alheios? 

Existamos, enfim!, em consciência!

19 de outubro de 2020

os meus cinco minutos # 47


A condição da mulher na sua relação com as figuras masculinas tem vindo a ser desvalorizada e subjugada por cânones totalitários e redutores previamente estabelecidos na literatura, ao longo dos séculos.

Retratada pelos escritores românticos como um ser distante e idealizado pelo amante, a mulher circunscrevia-se, essencialmente, ao ambiente doméstico ou poderia, quiçá, servir como adorno em ambientes sociais, contígua à própria existência masculina. Além do mais, o papel de esposa e mãe virtuosas estaria ainda, indelevelmente, interligado com um estereótipo de beleza ideal, regido por elevados parâmetros petrarquistas, como podemos comprovar, aliás, desde a poesia trovadoresca, resultando numa objetificação óbvia e indiscutível deste género.


Em Os Lusíadas, podemos testemunhar a presença feminina enquanto parte integrante da existência do próprio homem: ventres maternos, esposas e irmãs do peito lusitano que se distinguiu pelos seus feitos valorosos. No canto IX, na Ilha dos Amores, a exploração do corpo feminino como recompensa de atos heroicos faz-nos acreditar que as mulheres eram meros corpos inabitados com o propósito de serem avidamente consumidos e descartados.


Relativamente a Amor de Perdição, de Camilo Castelo Branco, também esta obra, que se insere no Romantismo Português, reforça o ténue papel da mulher na sociedade de então, sendo a sua idealização emoldurada por Teresa. Nesta crónica de mudança social, critica-se uma sociedade retrógrada e repressora, assente em  desigualdades, a começar pela discriminação de géneros e pela insignificância social do elemento feminino. De facto, podemos verificar que Teresa, enquanto mulher, não tem muitas opções de escolha: ou casa com o primo ou vai para o convento.

Da mesma forma, em Frei Luís de Sousa, a mulher, neste caso Madalena de Vilhena, é, mais uma vez, demasiado sentimental e pouco racional, comparativamente ao homem. Logo, o temor a Deus encontra voz no género feminino, retratado como originariamente pecador e submetido ao género masculino. Frágil e delicada, perante Telmo e deus, Madalena revela-se pecadora, adúltera e traidora, submetendo-se ao poder masculino de forma subserviente. 
Torna-se claro que a ideologia dominante masculina tem como porta-voz Telmo, mas encontra-se igualmente presente no discurso da própria D. Madalena, edificando-se, desse modo, a crise identitária da personagem. “Aquele estado” e o perdida “não sei de quê” são fórmulas vagas que representam um descontrolo físico e emocional que vem justificar, mais uma vez, a inquestionável fraqueza feminina. A sua morte simbólica, no final, confirma a perda de identidade da mulher que ousou seguir o impulso da paixão, desvinculando-se do elemento masculino e aniquilando-se, assim, pela imposta ordem dominante.


Estas obras permitem-nos, assim, uma reflexão sobre a conjuntura feminina ao longo dos tempos num diálogo aceso com a figura masculina, dela resultando a sua inegável subjugação. 


Partindo das obras referidas, podemos fazer uma sólida analogia com o cartoon O jogo dos Galos, de José António Santos Corte Real, de 2007, in Desigualdades e Preconceitos

Neste cartoon, observamos o Jogo do galo, em que a totalidade dos quadrados se encontra preenchida com o símbolo genético masculino de cor azul, à exceção do quadrado do meio, preenchido com um único símbolo genético feminino a cor de rosa. 

Podemos entender que, sendo este um jogo estratégico, e uma vez que os espaços se encontram todos preenchidos pelo símbolo masculino, o símbolo feminino não terá qualquer hipótese de ganhar seja o que for. 

Esta é uma forma metafórica de incapacitar o poder das mulheres num mundo maioritariamente dominado por homens.

17 de outubro de 2020

o sapatinho foi à rua # 517

 Este foi o look de ontem, a puxar para os vermelhos, os brancos e os azuis, e a mistura de padrões, ainda que discreta - quadradinhos e riscas (top!!!).

A mochila Fjälräven Kanken vermelha foi uma das minhas prendas de aniversário. Este não é o modelo tradicional a que já nos habituámos; é bem mais arrojado estilo- handbag, shoulderbag e backbag (adoro este conceito que combina com qualquer ocasião).

Vou usá-la todos, mas tooodos os dias!!!

Já agora, o anel de prata da Pandora também foi uma prenda da qual não me pretendo separar tão cedo, dá para ver porquê!! Diviiiino!

Bom fim de semana <3 







camisa: Lanidor

camisola: United Colors of Benetton

calças: Zara

blazer: Mango

ténis: Adidas Gazelle

mala: Fjällräven Kanken

anel: Pandora


11 de outubro de 2020

festa in the box

 44.

É verdade.

44 anos já cá cantam.

E é maravilhoso olhar à volta e comprovar que tudo na vida faz sentido.

Também é bom saber que as pessoas mais importantes se lembram de nós e que fazem toda esta jornada valer a pena.

Os abraços foram poucos, mas muito apertadinhos, e as prendas foram incríveis.

Na realidade, queria partilhar convosco a prenda mais out of the box que recebi: o conceito Festa in the box.

Conhecem?

Festa in the Box é levar a festa a nossa casa (seja para crianças, adultos ou... animais de estimação!!!).

Curiosos?

Cada box é preparada ao pormenor com muito amor, paixão, dedicação e criatividade, com os ingredientes mais exclusivos, à medida de cada um.

*

Eu recebi esta box fantástica, recheada de miminhos bons e inusitados, para festejar um momento especial.







Claro que a cerveja had me at hello, mas TUDO estava super mimoso e cutchi-cutchi.

Amei!!

Deixem-se surpreender <3

Façam já a vossa encomenda!!


Os envios chegam a todo o país!!


10 de outubro de 2020

o sapatinho foi à rua # 516

Há uns tempos, olhei para o meu guarda-fatos e apercebi-me de que a maior parte das minhas peças de roupa eram amarelas, azuis, vermelhas ou rosas.

Podia haver um castanho ou outro por lá, a espreitar.

Um casaquito.

Coisa pouca.

Uma saia preta também.

Mas verdes?

Nada.

Nada de verdes.

Nem uma única peça.

Na realidade, nunca fui muito à bola com verdes.

Então, só para contrariar, comecei a comprar uma peça ou outra dessa cor e agora já sou fãzaça.

*

Este é o meu blazer verde da Zara, num tom a puxar para o alface-irresistível.

Este look é um básico simples.

O blazer vem apimentar um pouco o visual casual chic.

Amoooo!!!

*

E como não nos apaixonarmos por este verde?







t-shirt: Primark
jeans: Levi's
blazer: Zara
ténis: Adidas


8 de outubro de 2020

o sapatinho foi à rua # 515

Olá! Olá!

Que saudades nossas!!

Isto do Covid mexeu com as rotinas e com os hábitos, e voltar à carga tem muito que se lhe diga.

Posto isto, vamos entrar com o pé direito e cheias de estilo?

*

Com este tempo ameno parece que estamos numa espécie de limbo entre os dias quentes que ainda cheiram a verão e um vislumbre de um outono que se avizinha mais fresco.

(Alguém tem saudades das malhas mais grossas ou sou só eu???)

look de hoje sugere frescura e jovialidade.

Meninas, preparem-se: os losangos vieram para ficar. Fazem-me lembrar a minha adolescência. Amooooo!! Usem e abusem!

Queria também dizer que estou apaixonadíssima pelas minhas boyfriend jeans da Pull & Bear!!! Lindonas, não acham?

*

E quem disse que salto raso não é sinónimo de elegância mentiu. Tenho dito!

Gritem todas: con-for-to!!!! 




camisola de malha: Zara

boyfriend jeans: Pull&Bear

ténis: Adidas

6 de outubro de 2020

caderneta de cromos # 27

 No final de uma explicação viro-me para um menino do 6º ano de escolaridade e digo-lhe qual é o trabalho de casa.

Ele responde-me.

Mas, Mané, eu preciso de descanso para ver a série...

os meus cinco minutos # 46

 Em "O sentimento dum Ocidental", de Cesário Verde, encontramos um espírito antiépico, nomeadamente, na atitude do sujeito poético face à realidade observada. Verifica-se, de facto, a descrença nas capacidades humanas num universo citadino gritante. Mergulhamos, então, numa viagem pela urbe que representa a degradação social e moral de um espaço "non grato". Embora as personagens sejam marcadamente antiépicas, tais como os marginais - os ladrões, os bêbedos, os jogadores ou as prostitutas - , ociosas e artificiais - dentistas, arlequins e lojistas -, a sua exaltação é palpável, cingindo-se unicamente às classes trabalhadoras. Já em Os Lusíadas, de Camões, assistimos, numa abordagem superficial, a um espírito aparentemente épico, com a exaltação das capacidades humanas. Todavia, o pano de fundo esconde um espírito avesso que se rebela e deixa antever a matéria que será o mote de Mensagem, de Pessoa. A viagem camoniana, essa, é marítima e não terrestre, dando conta da diáspora dos Descobrimentos. A personagem épica coletiva é o povo português, representado por Vasco da Gama e pelos marinheiros que com ele percorrem o caminho marítimo para a Índia. Assim, em duas viagens distintas, damos conta de que o povo português sempre foi o herói da literatura portuguesa; aquele que carregou as pedras e perdeu as mãos em guerras que nunca foram suas.



os meus cinco minutos # 45

 Sísifo, o mais astuto dos mortais, enganou os deuses e a morte por diversas vezes, sendo condenado por Hermes a executar uma tarefa inglória: deveria transportar uma pedra de proporções hercúleas até ao cume de uma montanha. Não obstante, ao alcançar o cume, escapar-se-lhe-ia das mãos, irredutivelmente, deslizando até ao sopé do monte. Sísifo, todavia, recomeçaria a tarefa, sabendo-a, de antemão, vã e sem esperança de um dia conseguir terminá-la.

Recomecemos, nós, tal como Sísifo, se pudermos, sem angústia e sem pressa - diz-nos Torga. E os passos que dermos, nesse árduo caminho do futuro, dê-lo-emos em liberdade. Enquanto não alcancemos não descansemos. De nenhum fruto queiramos, por Deus!, só metade. E, nunca saciados, vamos colhendo ilusões sucessivas no pomar - uma e outra e outra! Sempre a sonhar e vendo, acordados!, o logro da aventura. Somos seres humanos, não nos olvidemos! Só é nossa a loucura onde, com lucidez pessoana, nos reconheçamos. Recomecemos...


os meus cinco minutos # 44

 É inquestionável que Os Maias encerram um pensamento e incitam a metafísica. Todavia, o seu objeto de reflexão não é mais do que o próprio Portugal enquanto personagem espectral que atua por detrás das personagens palpáveis. Trata-se de um país moribundo, irremediavelmente romântico e destinado ao falhanço, como a Geração dos Vencidos da Vida. E também é verdade que, na obra saramaguiana O Ano da Morte de Ricardo Reis, o protagonista é unicamente o ano de 1936. O heterónimo pseudopessoano é apenas um engodo, um pretexto para Saramago pôr o dedo na ferida de um Portugal doente que ele sabia de antemão que iria morrer. Se Reis morria ou não, parece-me que não é assim tão importante.





os meus cinco minutos # 43

 A Laurinha, da música “Dona Laura”, de Miguel Araújo, encontra similitudes inquestionáveis na personagem George do conto homónimo, de Judite de Carvalho. De facto, a Laurinha destemida e decidida, que diz que é crescida e que prescinde dos conselhos do pai, encontra ecos em George, que se revela uma mulher de personalidade vincada, também ela independente e autónoma, dona da sua própria vida. Sem dúvidas, nem receios, George segue o seu caminho, deixando para trás um passado que pretende, a todo o custo, esquecer. Longe da família, e lutando, acima de tudo, pela liberdade, constrói o seu mundo, muda a cor do cabelo, coleciona amores e vai vivendo em casas mobiladas, sem nada que a prenda a ninguém. Longe, sobretudo, do olhar inquisitivo e reprovador de uma mãe que lhe impinge um mundo de aparências que nunca foi das mulheres - daí o pseudónimo masculino. Ao contrário de Laura, George mostra-se economicamente independente, provando que conseguiu ser alguém na vida. Na realidade, metamorfoseando-se, torna-se o oposto do seu arquétipo maternal, pois não lhe bastava ter “um olho na novela/ E o outro na panela”. Não. Isso não lhe bastava. Cosmopolita, tornou-se numa mulher culta e prestigiada, “Toda cheia de cidade” e sem “Nenhum vestígio da miúda outrora santa e singela”, a Gi, com o alto pescoço de Modigliani. Tal como Laura ou o heterónimo pessoano, Ricardo Reis, George “dança até ser dia”, aproveitando o momento presente, numa atitude plena de “carpe diem”, pois o tempo passa, tal como o rio corre para o mar. Georgina sabia disso e nós também sabemos “Que há-de chegar a hora/ Que não poupa ninguém”, o único crime que não pode ser perdoado - a velhice - e, com ela, o vazio devastador que a consome. Nós sabemos, então, algo que George desconhece: que nada, nem mesmo o dinheiro guardado no banco, pode colmatar o espaço em branco deixado pela solidão gritante. Parece-me, pois, que o futuro de Laura será a contiguidade do presente da sua mãe; já o futuro de George será a desertificação resultante de uma infância que a não soube amar, nem compreender e que fez com que procurasse um futuro com conquistas e com prazo de validade.



os meus cinco minutos # 42

 Experienciamos uma instância histórica e social que poderá, eventualmente, num futuro próximo, condicionar o modo como concebemos o ato social – a consciencialização de uma pandemia a nível mundial, o COVID19.

A catadupa de acontecimentos inusitados e o seu impacto direto no nosso quotidiano faz-nos repensar a conceção que temos do meio circundante, bem como das escolhas que decidimos tomar nas nossas vidas. O que define a Humanidade e a separa da brutalidade de outras espécies é, precisamente, o compromisso social. Existimos, porque existimos em sociedade. Estoicismos à parte, o coletivo não nos é alheio. De facto, a atual pandemia veio expor a fragilidade humana, pôr o dedo na ferida, alimentar adamastores e mostrengos e medos insondáveis. Na sua democraticidade, o coronavírus é o denominador comum entre ricos e pobres, transpondo países e raças e questões de género com o mesmo desprezo e desdém. Entretanto, não nos resta outra opção senão isolarmo-nos entre quatro paredes e esperar que Salazares e Mussolinis e Francos passem, sem destruírem tudo à sua volta.
Então, a irrelevância de sermos humanos emerge. Afinal de contas, deparamo-nos com um facto inviolável: morremos. Por instantes, iguais no medo e na morte, todos nos ajoelhamos a Deus ou à ciência na ânsia de uma solvência célere e certeira. Fechados em casa, comprovamos, enfim, como estávamos distantes de nós mesmos e do que realmente importa. Reparamos que, se Deus existe, não habita nos cacarecos lá de casa nem tampouco nos facebooks.
À distância, descobrimos, com este vírus, que somos muito mais do que indivíduos isolados, embora nos tenhamos tornado meros observadores de uma vida que já não reconhecemos e que não sabemos se algum dia regressará.