26 de fevereiro de 2020

os meus cinco minutos # 41


Por este caminho, e com a crescente desmotivação dos alunos do secundário relativamente à disciplina de Português, dentro de alguns anos, arrisco afirmar, ninguém estará francamente disposto a conhecer os clássicos da literatura portuguesa e, muito provavelmente, os conceituados autores portugueses não serão mais da lei da morte libertados.
A literatura tem os seus dias contados e há quem assevere que Camões é dispensável, O Livro do Desassossego, de Pessoa, também e Padre António Vieira deverá ser exterminado (se o quisermos estudar, teremos de ir para o Brasil, o que é algo, assim, a puxar para o irónico).


- Não é o fim do mundo, por deus! Não vamos precisar disso para nada. – bocejam, aborrecidos, os alunos do secundário que escolheram a componente científica e rosnam quando são confrontados com Pessoas e Saramagos e o caneco.

 
O lirismo, não há dúvida, tem vindo a dourar os textos de referência da nossa civilização e é essencial para uma reflexão madura sobre o presente e, sobretudo, sobre o futuro. 
Esta renúncia aos clássicos resume-se a um punhado de vazios projetado meramente para a sobrevivência quotidiana e primária, sem cogitar o que supera a realidade tangível.


Posto isto, vamos fazer as contas.
Vivemos matematicamente absortos dos ideais que importam, valorizando bens materiais e superficiais, em detrimento do que é realmente fulcral, recusando o intelecto que apenas subsiste em nós. 


A simplificação do ensino e dos conteúdos programáticos não pode confluir no depaupero dos saberes, sob pena de se entorpecer o entendimento e a razão. A ideia de que a aprendizagem aprofundada dos escritores portugueses deveria ser abolida ou diminuída e sujeitar-se unicamente aos alunos de humanidades é grave. 


Muito provavelmente, o abandono do ato de interpretar e de analisar é um dos principais motivos da crise que atravessamos – que é cultural antes mesmo de ser económica, política ou social. 
Se tal se concretizar, a educação cultural dos portugueses virá a ser de uma verticalidade oca e a recessão portuguesa, juro-vos, não será apenas económica.

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